Nos últimos anos tenho sentido um grau crescente de distanciamento emocional e agora que revejo o assunto vejo que é mesmo real e não está só na minha cabeça.
O que quero dizer com "distanciamento emocional" é muito simples: eu oiço os meus amigos e família, dou a minha opinião quando e como acho que devo, mas as questões não penetram no meu sistema emocional.
Ao ler-se, isto pode parecer comum, natural e óbvio, mas se pensarmos bem, quantas vezes nos deixamos afundar com os problemas dos outros, especialmente quando esses outros são os nosso mais queridos? E sim, dizer que os problemas dos meus não me afetam é egoísta e, acima de tudo, mentira.
Mas eu noto diferenças na forma como me sinto em relação a isso. É como se fizesse uma avaliação inconsciente do problema e decidisse que, já que não posso contribuir para a sua resolução, também não vale a pena ocupar o cérebro, o coração e todos os outros órgãos com isso.
Talvez seja a distância finalmente a fazer-se notar, talvez seja um mecanismo de auto-preservação para que consiga cumprir todos os meus objetivos, talvez esteja simplesmente a ficar "morta por dentro" (uma expressão comum entre doutorandos, que expressa a falta de sentimentos que nos assola com o tempo).
Sendo positiva, escolho dizer que, com o tempo, estou-me a tornar mais imune às coisas que não posso resolver.
Às vezes sinto-me a levitar por entre as quezílias dos outros, mas também das minhas.
Eu, que antes queria tudo para ontem e ruminava naquilo que não podia controlar, agora vem-me esta paz interior estranha que me diz clichés da vida como "faz o teu melhor e o resto virá a seu tempo".
Cada vez mais funciono com objetivos traçados numa folha mental que risco a bel-prazer. Cada vez mais oiço, olho, analiso e decido se vale o meu esforço.
Cada vez mais me conformo com o facto de que cada um tem o seu percurso e não podemos viver pelos outros, crescer pelos outros, fazer pelos outros.
Sei que corro o risco de ser vista (e de me tornar) demasiado insensível, demasiado objetiva, demasiado cínica. Mas estas alterações emocionais não são propositadas.
Não sou eu que conscientemente digo "vou ouvir, sorrir e desligar". Às vezes sinto-me em "piloto automático", mas é o meu corpo que entrou em modo de reserva, como o modo de "poupança de bateria" do telemóvel.
Será cansaço? Será maturidade? Será este o primeiro passo para me tornar ruim? Não sei.
Mas, afinal, qual é a alternativa?
Corroer-me por dentro porque as coisas más acontecem?
Largar tudo e atacar os problemas dos outros com a ideia utópica de que eu os posso resolver?
Chorar de noite por a minha vida não ser perfeita até ser vencida pelo cansaço?
Não me parecem melhores.
Para já, não vou fugir deste mecanismo esquisito que me traz calma e aceitação.